“Apresentação por António Sarpe em Moscovo, Rússia 26 Set 2014. Tradução livre e parcial por Paula Jardim.
A dança é na sua origem a celebração da vida, uma forma de comunicar com o mundo, com os deuses, com a natureza e com a comunidade. Esse era o significado de dança – conexão, encontro humano e celebração. E essa é a mensagem da Biodanza. Nós todos dançamos a nossa vida. Quando caminhamos pela rua dançamos a vida. Quando embalamos o bébé é uma dança de amor. Também dançamos quando encontramos um amigo e lhe damos um abraço. Estamos sempre em movimento. E quando os nossos movimentos são plenos de sentido tornam-se uma dança. Isto aplica-se também a movimentos mecânicos. Uma pessoa preocupada deprimida faz igualmente uma dança. Ela dança a sua tristeza e falta de esperança. Há muitas formas de dançar. A Biodanza ajuda-nos a dançar alegria, a expressão, o encontro consigo mesmo, com os outros e com o todo. Possibilita a conexão trazendo de volta a ligação ao corpo. Nós não temos um corpo. Nós somos o corpo. Eu sou o meu corpo. Não sou um cérebro que tem um corpo. Se fosse assim então o meu cérebro puxar-me-ia para um lado e o meu corpo para outro na direção oposta. Isso é dissociação. Nós desejamos integração. Eu sou o meu corpo. A forma como me movo, a forma como surjo, como pareço e comunico, esse sou eu. A minha alma está no meu corpo. O meu corpo é animado. Se temos vida temos muito de alma no corpo. Precisamos recuperar a nossa vitalidade e os nossos sorrisos de alegria.
Os bébés apenas conhecem dois afectos. A alegria de alguma coisa prazerosa e a tristeza que os faz chorar se não gostam de algo. Observo frequentemente como o meu filho de oito meses reage ao mundo. Como ainda não desenvolveu a linguagem, expressa-se através do corpo. É o que fazemos em Biodanza. Regressamos à nossa experiência pré-verbal de início. Antes dos seres humanos começarem a falar, eles já se movem e comunicam através de uma linguagem simbólica que não necessita de palavras. E é comunicação. Somos dotados de uma capacidade instintiva de nos expressarmos.
Biodanza conecta-nos aos instintos, por ex.o instinto gregário de fazer parte de um grupo. Somos mamíferos. O amor foi o primeiro dos instintos mamíferos. Temos um cérebro primitivo que nos faz lutar ou fugir, que nos faz defender território e procurar comida. Também temos um cérebro médio, o cérebro de mamífero, que nos faz olhar pelas nossas crianças e aprender a amar pela parentalização. Quando somos bébés, dependemos de alguém como dependemos do ar que respiramos. E essa pessoa deseja dar-nos todo o seu amor e proteção. A partir daqui o amor surge e encontra uma linguagem simbólica. Eventualmente começamos a escrever canções românticas, livros, poemas e a gravar filmes. Então o amor é um instinto que surge quando as condições estão presentes. E tudo isto pode ser dançado.
Dançar não é ter uma expressão de beleza estética. Dançar é expressar vida, amor, os seus desejos, as suas paixões, esperanças e transformar a sua vida. Dançar faz de si inteiro. Quando você dança tudo está lá, os seus sentimentos, emoções e desejos estão lá. E você descobre quem você é. Não de uma forma cognitiva como por ex.a identidade do seu passaporte, mas a partir da sua alma.
Então a dança foi originalmente a celebração de comunhão. Os primeiros grupos de humanos dançaram para os deuses para que a terra fosse fertile, para que conseguissem caçar animais e para que a Primavera trouxesse os seus frutos. Eles acreditavam que se não dançassem, os deuses não lhes dariam abundância. Por isso as pessoas dançavam a música juntas. Depois, lentamente a dança tornou-se um espectáculo com audiência e um bailarino virtuoso. Os grandes bailarinos eram aqueles capazes de utilizar a sua técnica para expresser a sua paixão, os seus sentimentos, com a grace de Nijinsky ou Baryshnikov. Mas os cidadãos comuns deixaram de dançar. “A dança não é para mim. É apenas para outras pessoas. Eu não sei dançar. Eu não sei cantar.” E reprimiram a sua dança. E na Biodanza aprendemos a dançar outra vez. Descobrimos que todos dançamos. Percebemos que mesmo quando estamos preocupados dançamos uma dança de angústia e depressão. Mas podemos aprender a dança da alegria.(…)”